Resumo
Sob a égide da estratégia “2030: Década Digital”, a conscientização dos cidadãos sobre os seus direitos fundamentais ao abrigo da CDFUE – bem como o empoderamento das organizações da sociedade civil, dos operadores jurídicos e das comunidades académicas – converteu-se num imperativo de sobrevivência do Estado de direito e da democracia na UE. Mas quem efetivamente são os destinatários da CDFUE? O artigo 51.º, n.º 1 da CDFUE destaca o efeito vertical das suas normas – isto é, a sua relevância nas relações entre os particulares e as autoridades que exercem o poder público –, aparentemente excluindo a sua aplicabilidade às relações entre particulares (pessoas singulares ou coletivas). É certo que o efeito horizontal dos direitos fundamentais não é aceite pela maioria das Constituições dos Estados-Membros da UE – ainda que através da regulamentação infraconstitucional das relações entre privados os direitos fundamentais eventualmente adquiram efeito horizontal em algumas áreas. Por que razão o efeito horizontal dos direitos fundamentais é tão relevante para o exercício da cidadania digital? Porque atualmente os atores privados, especialmente as plataformas digitais, definem os seus próprios termos e modelos de negócio, assumindo funções que são intrinsecamente conectadas com o exercício do poder público, mas sem a desejável transparência, responsabilidade, explicabilidade e razoabilidade dos processos e decisões. É indispensável assegurar que o exercício do poder, particularmente das entidades privadas que dominam o ambiente digital, é limitado por um adequado enquadramento jurídico. O valor do Estado de direito (artigo 2.º do TUE) implica a defesa dos cidadãos contra qualquer poder, submetendo o poder ao direito. Isto desafia a UE a mobilizar forças constitucionais e a converter a década digital numa oportunidade para a proteção de direitos fundamentais numa União de direito. E aqui a sustentabilidade perfila-se como um conceito matricial da década digital, definindo as condições e os pressupostos para a regulamentação jurídica num contexto de permanente evolução tecnológica.